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Opinião: José Silva Nunes, Presidente da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade
🕒 16:20h
Há demasiado tempo que a obesidade vive debaixo do equívoco e dos preconceitos da gula, da preguiça e da estética. Falar de obesidade é falar de uma doença com impactos muitos concretos na saúde das pessoas que com ela vivem, cuja prevalência temos sido manifestamente incapazes de inverter.
Para perder peso, não basta apenas comer menos e mexer-se mais. A obesidade não é uma escolha, nem uma questão de falta de vontade. É uma doença crónica que resulta de uma acumulação excessiva de gordura corporal, com causas biológicas, genéticas, hormonais, psicológicas e ambientais.
Em Portugal, 1 em cada 4 adultos vive com obesidade e dois em cada três apresentam peso em excesso, relegando o nosso país para o terceiro pior lugar da Europa. Acresce que a obesidade está associada ao aumento de um vasto universo de outras doenças agudas e crónicas. O seu impacto económico ultrapassa 1,1 mil milhões de euros anuais, cerca de 6% da despesa em saúde.
Mas mais do que números, estes dados traduzem o peso real de uma doença que afeta a vida e a autonomia de milhões de portugueses. Por tudo isto, a obesidade representa uma das mais graves ameaças à saúde pública.
Hoje compreendemos melhor a complexidade e os mecanismos científicos que estão na base da obesidade. A ciência explica porque é que algumas pessoas são mais suscetíveis à obesidade, bem como quais os fatores que aumentam o risco de desenvolver a doença e as suas complicações associadas. Os avanços das últimas décadas possibilitam uma abordagem capaz de devolver às pessoas qualidade de vida e o controlo da sua saúde. Felizmente, no momento em que vivemos é possível tratar e controlar a obesidade.
O primeiro passo para enfrentar esta epidemia continua a ser o mais difícil, porque é também o mais solitário. Muitos continuam a viver em silêncio, amarrados ao estigma e à culpa. Por isso, há que continuar a despertar consciências e promover mudanças de atitude. Precisamos de substituir o silêncio pelo diálogo, o julgamento pela compreensão e a inércia pela ação.
Parte do peso invisível da obesidade reside na perda de liberdade funcional e de confiança emocional. Quando se vive com o medo de não conseguir ter energia, agilidade e resistência para viver plenamente ou superar desafios, os receios mais profundos de quem vive com obesidade vão-se acomodando no corpo e na mente, fazendo-os ceder, pouco a pouco, a esse peso invisível que pode, agravar a progressão da doença.
É precisamente este medo invisível que temos que superar inspirando e apoiando as pessoas que vivem com obesidade a dar o primeiro passo, criando espaço para que possam conversar sobre as suas dificuldades e receios e adquiram confiança para procurar apoio médico.
É urgente olhar definitivamente para a obesidade como o que ela realmente é: uma doença crónica, complexa, que exige acompanhamento médico e políticas públicas eficazes, que convoquem uma cooperação e uma resposta multidisciplinar que saia do papel e mude realmente a qualidade de vida das pessoas que vivem com obesidade.
Artigo de Opinião, José Silva Nunes, Presidente da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO)
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